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Inflação por renda: por que os mais pobres sofrem mais?

O sobe e desce dos preços não afeta todo mundo do mesmo jeito. Dependendo da renda, o impacto da inflação pode ser maior ou menor. Entenda por que isso acontece.
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Nem precisa ser um especialista em economia para saber quando os produtos e serviços estão mais caros. Basta uma ida ao supermercado. Se você saiu de lá com menos sacolas do que da última vez, mas o gasto foi o mesmo ou até maior, já sabe: os preços subiram e a inflação pesou mais no bolso. Mas será que esse peso é igual para todo mundo? Não é. 

Existem vários fatores que fazem o impacto da inflação não ser igual para todas as pessoas. Um deles é a renda. Você não compra os mesmos produtos e serviços que o seu vizinho, mas há semelhanças na cesta de consumo de pessoas que estão na mesma faixa de ganhos. 

Em geral, os grupos de mais baixa renda sentem mais o peso da inflação do que aqueles com renda maior. Entenda, abaixo, por que isso acontece e a diferença do impacto da variação dos preços por faixa de renda. 

https://www.youtube.com/watch?v=ktUm-3HzQS4

Por que a inflação é diferente para cada faixa de renda?

Cada pessoa tem um consumo individual diferente. Por isso, a inflação pessoal não é igual a inflação oficial do país. Em outras palavras, o peso da inflação tem a ver com o que você compra e não com o quanto você ganha. 

Por outro lado, a renda define o seu acesso a produtos e serviços. Quem ganha mais, tem possibilidade de comprar mais, tanto em quantidade como em diversidade de itens. Já quem ganha menos, tem o seu consumo muito restrito a itens básicos. 

O que isso tudo quer dizer? Que é mais fácil duas pessoas de baixa renda terem uma cesta de consumo parecida do que duas com renda maior. 

Imagine que Marcelo e Maria ganham R$ 10 mil por mês. Maria gosta de viajar e ir a restaurantes. Já Marcelo é mais caseiro, prefere comprar itens para plantas e pedir comida em casa. Eles sentirão a inflação de forma muito diferente, ainda que recebam o mesmo salário, porque compram coisas muito diferentes.

Agora imagine duas pessoas que recebem um salário mínimo de 2022 (R$ 1.212). Com essa renda, dificilmente elas conseguem sair do básico, que é alimentação, contas básicas (luz, água) e transporte. Nesse caso, não sobra dinheiro para comprar e diversificar produtos e serviços. Por isso, mesmo sendo pessoas diferentes, a cesta de consumo da baixa renda acaba sendo muito parecida. 

Mas o que é baixa renda no Brasil? 

Segundo a Secretaria de Desenvolvimento Social, são consideradas famílias de baixa renda aquelas que possuem renda mensal por pessoa (renda per capita) de até meio salário mínimo (R$ 606, considerando o mínimo de 2022) ou renda familiar total de até três salários mínimos (R$ 3.636).

Contudo, para os cálculos de inflação, a conta muda um pouco, dependendo de quem mede a variação dos preços. 

O IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo), medido pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), é o indicador oficial de inflação do país. Ele mede a variação de preços de uma cesta de itens de nove grupos diferentes consumidos por famílias com renda de um a 40 salários mínimos, que moram em 10 regiões metropolitanas, cinco municípios brasileiros e no Distrito Federal. 

Ou seja, ele acompanha a evolução de preços de itens consumidos por um perfil amplo de consumidores, e não reflete a realidade de quem ganha menos. Por isso, o IBGE também divulga o INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor), que mede a variação dos preços da cesta de consumo da população assalariada com mais baixo rendimento – famílias que ganham de um a cinco salários mínimos. 

Esse indicador é conhecido como a inflação da baixa renda, mas veja que ele considera rendimentos por família de até cinco salários mínimos – diferente do critério de baixa renda da Secretaria de Desenvolvimento Social, que vai até três salários mínimos. 

Inflação por renda

Há ainda outro indicador de inflação, que mede a evolução dos preços por faixa de renda, calculado pelo Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada). Para esse cálculo, o Ipea considera as seguintes rendas mensais por família: 

Faixa de rendaRenda domiciliar
Renda muito baixaMenor que R$ 1.808,79
Renda baixaEntre R$ 1.808,79 e R$ 2.702,88
Renda média-baixaEntre R$ 2.702,88 e R$ 4.506,47
Renda médiaEntre R$ 4.506,47 e R$ 8.956,26
Renda média-altaEntre R$ 8.956,26 e R$ 17.764,49
Renda altaMaior que R$ 17.764,49
Fonte: Ipea

Veja que as faixas de renda mais baixas também são diferentes das consideradas pelo IBGE e pela Secretaria de Desenvolvimento Social. Levando em conta essas três instituições, o maior limite é do IBGE – ou seja, baixa renda é quem tem renda familiar total de até R$ 6.060 ou cinco salários mínimos de 2022. 

E por que a baixa renda sofre mais com a inflação? 

Como você viu, o orçamento da baixa renda só dá para o básico. Nessa faixa de renda, a alimentação é prioridade. Segundo dados do IBGE, 60% da renda de quem ganha menos é gasta com comida. Mas esse percentual vai subindo quanto menor for a renda. As contas básicas de casa, como luz, gás de cozinha e água, também estão na lista das prioridades, assim como o transporte, seja ele público ou particular.   

"Os produtos que têm subido bastante de preço são os ligados à subsistência, que afetam diretamente a baixa renda, que acaba gastando tudo o que tem com esses produtos. Não sobra nada para eles tentarem se proteger", afirma a economista Juliana Inhasz, professora do Insper. 

É justamente esse básico que acaba sofrendo as maiores variações de preços. Entenda os motivos. 

Alimentação: clima e dólar afetam preços

Os preços da base da nossa comida, como os grãos (trigo, arroz, feijão, milho) e as proteínas, são muito suscetíveis à lei da oferta e da demanda. Lembra dela? Quando a oferta de um produto está muito baixa, mas a demanda está alta ou não mudou, os preços sobem. E quando a oferta sobe com a mesma demanda ou com ela menor, os preços caem. 

A procura por alimentação dificilmente cai, por ser um item básico. Já a oferta… essa depende de uma série de fatores externos, como os climáticos. Chuva a mais, frio mais intenso ou seca fora de hora podem reduzir a produção de alimentos básicos e diminuir a oferta no mercado interno. Oferta menor, preço maior. 

Mas não é só isso. O Brasil é um dos maiores produtores e exportadores de itens básicos de alimentação, como os grãos e as proteínas. Quando um produtor exporta, ele vende para outros países, e recebe em dólar. Se ele vende dentro do país, ele recebe em real. Ou seja, vender para fora do país acaba sendo mais atrativo para quem exporta. Quando o real está desvalorizado frente ao dólar, como ocorreu nos últimos anos, essa vantagem aumenta ainda mais. 

Além disso, quando há um aumento de busca por esses alimentos no mercado internacional, fica mais vantajoso ainda vender para fora do que para dentro do país.

Alimentos pesaram no bolso nos últimos anos

Todos esses motivos contribuíram para que a inflação dos alimentos subisse muito em 2020 e 2021, por exemplo. Veja a inflação dos alimentos, segundo o IPCA e o INPC (arraste para o lado para ver a tabela completa).

AnoIPCA alimentosIPCA geralINPC alimentosINPC geral
202014,09%4,52%15,53%5,45%
20217,94%10,06%7,71%10,16%
Fonte: IBGE

Veja que, em 2021, a inflação oficial (IPCA) e a da baixa renda (INPC) foram muito parecidas. Além disso, a inflação dos alimentos foi maior no índice geral em relação ao da baixa renda. Isso significa que a baixa renda sentiu menos? Não. Para quem ganha pouco, 10% faz muito mais diferença do que para quem ganha mais. 

Contas básicas: clima e investimento interno fazem a diferença

O clima também afeta a conta de luz. Isso porque 65% de toda a eletricidade gerada no país é hidráulica, de acordo com a EPE (Empresa de Pesquisa Energética). Em outras palavras, o Brasil é muito dependente de chuvas para manter as hidrelétricas cheias e, assim, ter energia. 

Quando o país passa por um período de seca, como a escassez hídrica de 2020 e 2021, por exemplo, essa energia fica mais cara. Por quê? Porque em situações como essa, as usinas termelétricas são ativadas para compensar a perda de energia gerada pelas hidrelétricas. 

O problema é que a operação das termelétricas é mais cara. Então, para bancar esse custo adicional, a Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) usa bandeiras tarifárias, que indicam se a energia custará mais ou menos em função das condições de geração de eletricidade. Em 2020, por exemplo, a agência criou a bandeira da escassez hídrica, que acrescentou R$ 14,20 na conta de luz a cada 100 kWh consumidos. Essa bandeira operou até abril de 2022. 

Energia foi vilã em 2021

Não à toa, a energia foi uma das vilãs da inflação em 2021 (arraste para o lado para ver a tabela completa). 

AnoIPCA
Conta de luz
IPCA geral
INPC
Conta de luz

INPC geral
202121,21%10,06%20,47%10,16%
Fonte: IBGE

O aumento dos preços da conta de luz poderia ser bem menor se o país investisse mais em outras formas de energia. Essa é a conclusão de um estudo do Ipea que calculou que o Brasil investiu em 13 anos (de 1999 a 2012) R$ 806 milhões em energias renováveis, o equivalente a 0,0013% do PIB daqueles anos. 

Já um estudo do Conselho Global de Energia, da ONU (Organização das Nações Unidas), o país poderia acrescentar US$ 22 bilhões à economia se investisse em energia eólica até 2026, e ainda poderia reduzir o custo total da energia – beneficiando a baixa renda, principalmente. 

Transportes e gás de cozinha: alta no mercado internacional encarece os boletos

O aumento dos transportes está relacionado, principalmente, à alta do petróleo, que é a matéria-prima dos combustíveis. O preço do petróleo produzido aqui tem como base o preço do mercado internacional. Se esse preço sobe lá fora, ele sobe aqui também. E se esse valor sobe, o produto final também fica mais caro. 

O produto final é o combustível do carro, do ônibus e também o gás de cozinha – boletos básicos de muita gente.  

Isso sem contar os impostos. Segundo a Petrobras, mais da metade do preço do combustível que chega até você representa impostos estaduais e federais, custos adicionais com o biodiesel e margem da distribuição do diesel e dos postos. 

Ou seja: o preço pago pelos brasileiros no diesel, gasolina e gás de cozinha é mais alto pois sofre a incidência de impostos, custos da distribuição, lucro e outros componentes no preço.

Considerando que o preço final dos combustíveis leva em consideração também a oferta e demanda do petróleo, a cotação do dólar e outros movimentos da economia, qualquer mudança terá impacto no seu valor — e, por consequência, também na conta do consumidor final.

Tem como a baixa renda sofrer menos com a inflação? 

Segundo a economista Juliana Inhasz, professora do Insper, o caminho é o aumento da renda mesmo. Mas nem isso tem ajudado os brasileiros. De acordo com dados do IBGE, a renda média dos brasileiros tem caído trimestre após trimestre, e atingiu R$ 2.569, o segundo menor valor em 10 anos. 

A situação piora em um ambiente de desemprego alto, que só puxa essa renda para baixo. Mais de 11,5 milhões de pessoas estão desocupadas, segundo o IBGE.

Para quem ganha pouco, mas consegue ter alguma margem de manobra para mexer na cesta de consumo, a professora dá algumas dicas para tentar driblar o aumento de preços. 

"O que as pessoas podem fazer para tentar se proteger dessa inflação é tentar substituir marcas por uma mais barata, substituir por tipos de produtos mais baratos, tentar evitar desperdício e fazer pesquisa de preços", afirma. 

Preços vão cair?

A economista explica, porém, que para uma boa parte da população nem a substituição e nem a pesquisa de preços está deixando as compras do supermercado mais baratas. É que desde 2020, o país enfrenta um aumento generalizado de preços, que não deve ceder tão cedo principalmente por questões externas que podem demorar a passar, como é o caso da guerra na Ucrânia.  

"Os preços continuarão pressionados. Com a guerra, os preços de commodities seguem em alta, deixando as coisas mais caras aqui. Ninguém vai ter muito alívio tão cedo. O que pode acontecer é que essa inflação vai começar a desacelerar – ou seja, ela vai subir menos, mas vai subir", afirma.  

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